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Podemos dizer que o mundo mudou radicalmente e que este foi um mês vertiginoso nesse sentido. A situação geopolítica atual, encaminha-nos para uma incerteza sobre o que pode ser a ordem futura, mas sabemos que será certamente diferente do passado pré pandemia, tal como conhecemos.

Por muito que seja comum falar-se de um escalar da divisão dentro da união europeia e da relação transatlântica, temos que admitir que assistimos a uma resposta fortíssima que será marcada também pela presença de Biden no Conselho Europeu no passado dia 24 de março, com uma Cimeira especial da Nato e do G7, demonstrando que os aliados estão solidários.

Houve neste último mês, um claro relançamento da Nato como uma aliança defensiva que ainda não tínhamos testemunhado antes, com grande coesão interna e sentido de futuro com dinamismo. A definição de um inimigo comum, impulsionou uma forte integração europeia impulsionada pela situação geopolítica, mais rápida e forte, do que a própria união europeia teve capacidade nos últimos 10 anos.

Finalmente vemos a união europeia com predisposição para deixar de ser tão dependente a nível energético da Rússia, a fazer avanços na sua integração no domínio da defesa.

As ramificações do impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia, não se ficam apenas pelo contexto europeu ou pelas relações transatlânticas. O acordo de paz nuclear está também suspenso neste momento, por imposição da Rússia. Vemos a disputa entre Israel e a Turquia, existe uma forte pressão dos EUA sobre a China para que esta não apoie a Rússia, a India está numa posição relativamente ambígua, e temos mudanças de fundo sistémicas a ocorrer. É um novo quadro de interações internacionais que podem levar a uma continuação da reconstrução de uma ordem internacional.

Começamos a assistir a uma Rússia cada vez mais isolada, e a incerteza e insegurança estão a levar a uma inflação económica mais elevada e a uma tendência para uma desglobalização que pode levar à criação de blocos, tecnológicos, ideológicos e militares, mais fechados ainda que não totalmente bloqueados.

Será necessário reorientar e redirecionar os pacotes de financiamentos, e estão a ser organizados para a energia, para a defesa e para a segurança alimentar, fundos específicos com a ideia de dar funcionalidade a certos instrumentos da dívida comum para fundos muito concretos.

A segurança alimentar e crise alimentar global é também real e que pode levar a grandes movimentos de segurança e movimentos migratórios.

Verdadeiramente estamos num quadro em que muita coisas podem acontecer.

Numa Conferência online promovida pela Fundação Gulbenkian no passado dia 21 de março, intitulada: Invasão da Ucrânia – Desafios para a Europa e para o Mundo, Durão Barroso referiu que uma Rússia cada vez mais dependente da China pode acelerar um processo de desglobalização.

Estamos perante uma mudança de paradigma

A desglobalização é um termo usado principalmente como referência à desconstrução dos ideais da globalização económica, social e cultural e que pelo contexto atual, acredito que estamos a trilhar esse caminho.

No entanto, tal como referiu o nosso Diretor Nuno Moreira da Cruz numa das nossas newsletters passadas , deu-se uma clara reação do mundo corporativo relativamente ao conflito, quando vimos “tantas empresas, de tantos setores e de tantas geografias, se uniram para “expressar” as mesmas visões e condenações”, o que me faz acreditar que, assim como assistimos ao relançamento da Nato e a um fortalecimento da União Europeia neste ultimo mês, estaremos também a assistir a uma reorganização e união económica do mundo corporativo em torno de um propósito que pode vir a desenhar algo novo, que poderá ser efetivamente, um novo paradigma corporativo.

Seguiremos certamente atentos a esta mudança constante não deixando de acreditar que os Negócios Responsáveis serão transformadores desta “force for good” que sabemos existir.

 

Mafalda Sarmento, Research & Project Developer do Center for Responsible Business & Leadership da CATÓLICA-LISBON