Gerir a tesouraria em tempo de crise

Imprensa

Temos sempre que ter presente que o "cash" está para as empresas como o sangue está para o corpo humano. Sem ele, as empresas definham e morrem rapidamente.

Vivemos tempos difíceis e únicos no sentido em que nenhum de nós tem experiência ou conhecimento de situações semelhantes que nos ajudem a tomar decisões, que garantam a sobrevivência das nossas empresas.

Em Finanças dizemos muitas vezes que “cash is king” e nos tempos que vivemos, esta frase, que surgiu em 1974, é mais actual do que nunca.

Assim, todas as decisões que tomarmos nos próximos meses devem ser tomadas numa lógica de cash-flow (e não numa lógica de resultados/lucro).

Temos que tomar todas as medidas possíveis para conseguir uma preservação de cash o mais alta possível.

Temos sempre que ter presente que o cash está para as empresas como o sangue está para o corpo humano. Sem ele, as empresas definham e morrem rapidamente (sendo essa a principal causa de encerramento de empresas).

Existem várias medidas que provavelmente muitas das empresas já tomaram:

  1. Adiar/atrasar todos os pagamentos, nomeadamente utilizando todos os mecanismos concedidos em termos fiscais e da segurança social;
     
  2. Informar os fornecedores que dado que a entrada de dinheiro parou, os pagamentos só poderão recomeçar com o reinício da actividade, e mediante acordos;
     
  3. Obter todos os empréstimos de médio prazo que for possível obter, em particular as linhas PME Covid-19;
     
  4. Planear e controlar de forma minuciosa a tesouraria.

Mas temos que nos preparar para o relançamento da actividade, tendo presente que a maior parte das empresas tem necessidades de fundo de maneio positivas, pelo que o reinício da actividade vai ser altamente consumidor de cash.

Assim tem que ser dada uma especial atenção a esta fase, para que a empresa não entre em dificuldades financeiras mais à frente, quando já se está a recuperar em termos económicos.

Temos assim que tentar minimizar o seu impacto, nomeadamente através de:

  1. Acordos com clientes, que nos permitam incluir as futuras vendas num programa de factoring que nos permita gerar liquidez ou, em alternativa, que com a entrega de novos fornecimentos seja feito um pagamento de valor superior ao que se fornece, para que o saldo em dívida se vá reduzindo;
     
  2. Acordos com fornecedores através da implementação de um programa de confirming, que nos permita pagar a um prazo mais longo, sem prejudicar as relações com os fornecedores, ou, em alternativa, que sempre que recebemos nova mercadoria pagamos um valor superior ao que recebemos, para que o saldo em dívida se vá reduzindo;
     
  3. Stocks. Deixar reduzi-los ao mínimo possível. Não é possível continuar a trabalhar com matéria-prima que dá para várias semanas de fabrico.

No fundo, temos que diminuir o que se denomina o cash conversion cycle, ou seja, minimizar as necessidades de fundo de maneio.

E todo este processo tem que ser acompanhado de um elevado controlo de tesouraria, nomeadamente:

  1. Elaborando um orçamento de tesouraria que deve cobrir um horizonte até 3 meses, com detalhe semanal;
     
  2. Assim, podemos ver, semana a semana, quais vão ser as nossas necessidades/excessos de fundos e devemos controlar depois com o que realmente sucedeu;
     
  3. Este orçamento deve ser actualizado todas as semanas, adicionando mais uma e retirando a que passou.

No fundo, para muitas PME´s temos que viver mais numa economia baseada em cash do que numa economia baseada em lucros económicos, que não têm uma correspondência imediata em dinheiro no banco.

José Tudela Martins, Professor da CATÓLICA-LISBON.